segunda-feira, 12 de novembro de 2007

O brinquedo que não sabia brincar

Dias reais. Era tudo o que queria. Mas a virtualidade da minha vida insistia em permanecer. O personagem que criei havia se tornado mais forte do que o meu eu real...
Que linda! Uma moça forte, corajosa, bem resolvida, atraente, bonita, sexualmente satisfeita, com muitos amigos, com uma vida social agitada, morando em um excelente condomínio, num excelente bairro, na cidade dos sonhos de muita gente. Aos 30 anos já havia feito as três coisas fundamentais de um ser humano: plantado uma árvore, tido uma filha e escrito um livro. Quem não gostaria de ser aquela moça que espalhava conselhos aos quatro ventos e era o guru até da sua família. Nas virtudes femininas, era a mais fêmea das mulheres; nas desvantagens de ser mulher, tinha comportamentos cheios de testosterona. Buscava as falhas em si, pois além de tudo era humilde... e não encontrava.
Até que surgiu um fetiche para colocar a moça linda diante do espelho. Há maldade no DNA da personagem. O lado mais negro de um ser humano estava presente na moça perfeita, correta, amiga, amante.
O fetiche era como um brinquedo que ela não havia gostado de brincar porque ele não sabia brincar; não era o brinquedo que era desinteressante, era ela quem não sabia o que fazer com ele. Era um Adônis, de semblante forte, olhos expressivos, corpo definido, voz macia e jeito sedutor. Capa dura e essência frágil, insegura, pedindo para ser protegido, cuidado, embalado.
A moça, que queria jogar o brinquedo fora, não sabia mais o que fazer porque o brinquedo havia se tornado parte do cenário da personagem. Para se livrar do brinquedo, ela teria que se livrar dela mesma, da personagem. Ela não sabia mais ser ela mesma, aquela criatura real com falhas reais, fraquezas reais, inseguranças, tristezas, mentiras e verdades, absurdos e trajetória comum.

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