quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O sobrado das paranoias

Um sobrado nada sombrio, de cor amarela clara e grades brancas. Três andares, sendo o segundo e o terceiro andar do lado direito ocupados pelo mesmo apartamento, com ampla janela em forma de telhado projetado adiante. O morador? Alguém chamado GOR. Sim, assim mesmo com letras maiúsculas.



As ruas que abrigavam o sobrado eram em forma de estilingue, ou o popular 'pé-de-galinha'. Os carros estacionados nas ruas, que inclinavam-se levemente para baixo no lado esquerdo da construção, eram escuros e um deles GOR insistia em dizer que era meu. Estava batido e com os piscas-alertas ligados. Como ele havia me dito que o carro era meu? Pelo celular. Eu havia ligado para ele pedindo permissão para subir ao apartamento com Emerson, Mayara e o rosto conhecido sem nome para limparmos a sujeira.

A voz grossa e imponente permitiu e assim que chegamos na portaria do prédio em forma de sobrado, ouvimos, cada um de nós, vozes que eram familiares vindas de cima, justamente daquele espaço com cortinas claras, de tecidos leves esvoaçantes.

Cada um, entregue à sua paranoia, sentia escapar daquele espaço convidativo com sons e sensações segredos singulares. Percebi que nós ouvíamos sons distintos, vozes incômodas e particulares. As minhas eram cantorias estranhas de alguém que há poucas semanas se foi da minha vida, mas cujas frases ainda fazem eco na minha alma. Aliado às frases, algumas cenas de pessoas conhecidas ou não aos beijos com o atual proprietário do meu "Anahata".

Vi que cenas estranhas passavam pelas mentes de Emerson, Mayara e o rosto conhecido sem nome. Era um misto de pavor e repulsa que eu presenciava pelos seus olhos e realmente não sei como eu podia acessar essas informações mescladas à voz hipnotizante de GOR.

Mesmo assim entramos e fomos ao elevador, muito antigo, com porta escura de madeira e chão coberto por pastilhas de hotel em estilo art nouveau. Apertamos cada qual um andar, mesmo sabendo que iríamos ao mesmo local. E ao abrir a porta pesada, uma vasta luz nos ofuscou, fazendo com que cada um voltasse à rua num Déjà vu estranho, randômico e repetitivo, onde somente eu tinha consciência disso. Como se cada vez que retornássemos fosse uma chance de anular mais uma das paranoias que nos impedem de subir ao andar correto e limpar a 'sujeira' da nossa alma.
 
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